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Boa Pedida – Proposta de inclusão do direito de retirada na Lei de Arbitragem promove equilíbrio saudável
Joaquim Simões Barbosa
In: Revista Capital Aberto, Edição nº 125, Janeiro de 2014, página 56.
A arbitragem poderá ser muito útil para o mundo corporativo, caso a sua inclusão no estatuto das companhias se confirme como método seguro de solução de litígios societários. Atribuir a resolução desses conflitos a árbitros especialistas, capazes de oferecer a decisão definitiva em tempo adequado, é perspectiva das mais atraentes.
Para atingir esse ideal, é preciso superar desafios importantes. Todos os acionistas de uma companhia podem discutir a validade de uma deliberação assemblear, o que abre espaço para múltiplas arbitragens e tribunais, com risco de decisões conflitantes entre si. É viável reunir todos num único procedimento, dando-lhes oportunidades iguais para participar, inclusive na nomeação de árbitros, na escolha de advogados e na definição de estratégias?
Não se trata de uma questão fácil. Mas é possível equacioná-la, com cuidadosa e criativa redação das cláusulas e dos regulamentos das entidades arbitrais especializadas, tarefa à qual as melhores mentes jurídicas brasileiras têm se dedicado. Há um ponto, no entanto, cujo equacionamento demanda intervenção legislativa: a vinculação de todos os acionistas à cláusula de arbitragem.
A opção pela via da arbitragem implica renúncia à justiça estatal e a todo um arcabouço que existe para garantir um processo justo e equilibrado (regras sobre juiz natural, duplo grau de jurisdição, controle de aplicação do direito pelos tribunais superiores, entre outras). Isso é aceito e até mesmo estimulado, com fundamento numa premissa essencial: a renúncia se funda no consentimento livre das partes. Sem esse princípio, contudo, o edifício da arbitragem desmorona por completo. O que com ele é virtude, sem ele torna-se inaceitável.
Prevalece hoje, na melhor doutrina, o entendimento de que a lei autoriza a introdução da cláusula arbitral por escolha da maioria e que todos os acionistas estão vinculados à deliberação, até mesmo aqueles que a tenham expressamente rejeitado. Essa ideia é coerente com a sistemática das sociedades anônimas (S.As.), em que vigora o princípio majoritário – prevalece o voto da maioria. Causa uma tensão, porém, com os fundamentos básicos da arbitragem, pois poderia bloquear o acesso ao Judiciário de um litigante que com isso nunca anuiu, nem mesmo tacitamente. O assunto ainda não foi levado aos tribunais e, por isso, gera compreensível insegurança jurídica.
É oportuna a proposta de regulamentação do tema feita pela comissão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) presidida pelo ministro Luiz Felipe Salomão, sob inspiração do direito italiano. A reforma da Lei de Arbitragem, de 1996, prevê a vinculação de todos os acionistas, mas assegura aos dissidentes o direito de retirada mediante reembolso do valor das suas ações – salvo quando se tratar de companhias abertas com significativos índices de liquidez e dispersão acionária, que permitem a venda do papel no mercado. Busca assim uma manifestação, ainda que tênue e apenas tácita, da concordância com a opção pela arbitragem. O legislador presume que, se o acionista decidiu permanecer, mesmo podendo se retirar da sociedade, foi porque aceitou a preferência da maioria.
Por meio de um mecanismo societário típico, preserva-se o princípio majoritário e, ao mesmo tempo, garante-se aos dissidentes o exercício da rejeição efetiva, essencial para a existência da verdadeira opção. Alcança-se, assim, um equilíbrio saudável que certamente trará maior segurança jurídica ao instituto da arbitragem.