ARBITRAGEM NO MERCADO FINANCEIRO E DE CAPITAIS
Joaquim Simões Barbosa
In: Revista da ADEVAL – Associação das Empresas Distribuidoras de Valores – 12/2002.
As principais inovações introduzidas pela nova lei brasileira de arbitragem, de 1996, que afastaram os obstáculos que historicamente impediram o desenvolvimento do instituto, foram consideradas constitucionais pelo Supremo Tribunal Federal em histórica decisão de dezembro de 2001. Além disso, coroando o processo de consolidação da arbitragem no Brasil, vem de ser recentemente promulgada a Convenção de Nova Iorque sobre reconhecimento e execução de laudos arbitrais estrangeiros, medida de grande impacto para a credibilidade do país no exterior.
A utilização da arbitragem para composição dos conflitos que surjam no âmbito de um determinado relacionamento contratual oferece vantagens extraordinárias em relação à justiça estatal, as quais são bem conhecidas dos principais países do mundo, que há muitas décadas fazem uso desse instituto com grande sucesso.
A composição do conflito se torna menos traumática porque feita na forma consensualmente adotada pelas partes. Os árbitros têm as qualificações e experiência mais recomendáveis para o exame do caso porque são escolhidos especificamente para nele atuar, o que pode ser fundamental quando as questões envolvidas são mais sofisticadas e especializadas. Os árbitros não têm a sobrecarga de casos rotineiros que sufoca a Justiça Estatal, podendo decidir de forma mais rápida e com maior envolvimento e dedicação a cada caso. Ao contrário da Justiça Estatal, na arbitragem os procedimentos são sigilosos.
Tudo isso gera um natural entusiasmo em torno do instituto, que vem sendo crescentemente utilizado nas mais diferentes relações negociais. Especificamente no campo do mercado financeiro e de capitais, contudo, é preciso certa cautela. O recurso à arbitragem soluciona o conflito na medida em que o árbitro ou tribunal arbitral diz o direito que cabe a cada uma das partes envolvidas no litígio, passando o laudo por eles emitido a constituir um título executivo, que pode ser levado ao Poder Judiciário para execução forçada, caso uma das partes se recuse a voluntariamente cumprir a decisão. Mas o Estado continua a deter o monopólio do uso legal da força e, por isso, somente o Judiciário pode promover a execução forçada das decisões.
Assim sendo, não é aconselhável a eleição da arbitragem em contratos que dão origem a obrigações de pagar quantias líquidas e certas, objeto de títulos extrajudiciais. Nesses casos, tão comuns nos contratos usualmente celebrados no mercado financeiro e de capitais, a utilização do instituto teria por efeito apenas retardar o processo de recuperação do crédito.
Isso não quer dizer que não haja espaço para a arbitragem nesse importante setor da economia. Muito ao contrário. A Câmara de Arbitragem do Mercado, criada pela Bovespa, por exemplo, bem ilustra as imensas possibilidades que o instituto apresenta também nesse campo. A câmara se destina a compor os conflitos que surjam entre os participantes dos segmentos especiais de listagem da Bovespa, entre eles o chamado “Novo Mercado”, iniciativa da bolsa paulista cujo objetivo é o de promover a melhoria dos padrões de governança corporativa das companhias abertas brasileiras. A submissão dos conflitos societários à arbitragem constitui uma das principais medidas tomadas com esse objetivo.
A Bolsa de Mercadorias & Futuros – BM&F é outro importante exemplo de bom uso do instituto na área financeira. A submissão à arbitragem é condição para admissão de qualquer pessoa como sócio da BM&F ou para realização de negócios intermediados por corretores a ela ligados.