Uma Sugestão de Arrepiar
Julho de 2024
Virgilio Borba
O Valor de 16/07 publicou, sob o título “Debate de direitos minerários voltará à agenda”, notícia que narra críticas do governo federal – o Presidente e o Ministro do MME – sobre o que entendem haver, por parte das mineradoras, desinteresse em investimentos em pesquisa mineral e, mais notadamente, a inatividade ou suspensão de trabalhos de lavra em minas já concedidas. Nas palavras do Presidente, as mineradoras “sentaram em cima” de riquíssimos depósitos minerais. Por conta disso, o governo voltará a debater proposta de cancelamento de direitos minerários.
A crítica, se procedente, deveria dirigir-se também e primeiramente, à Agência Nacional de Mineração – ANM, que tem como competência, dentre outras, as de gerir os direitos e os títulos minerários para fins de aproveitamento de recursos minerais, fiscalizar a atividade de mineração e aplicar sanções cabíveis nos casos de infração à legislação.
O Código de Mineração de 1967 – e aperfeiçoado ao longo dos quase sessenta anos decorridos desde então – pune a suspensão dos trabalhos de lavra sem prévia comunicação à agência reguladora, autoriza a declaração de caducidade de título de pesquisa e de lavra em caso de abandono de jazida ou mina.
O regulamento do Código de Mineração de 1968 (Dec. n° 62.934) estabeleceu a forma de apuração de infrações, prazos para defesa e recurso na esfera administrativa e inclusive para recurso ao Poder Judiciário.
O atual Regulamento, decretado em 12/06/2018 e modificado em 15/09/2022 (Decretos n° 9486/2018 e nº 11.197/2022) manteve os princípios de contraditório e de ampla defesa.
Eis que agora, em 2024, surge uma sugestão de arrepiar.
O Valor traz a proposta de um “especialista” – cuja especialidade e nome não foram revelados – para “pressionar as empresas e cassar títulos.”
Como fazer isso? O “especialista” dá a receita: reduzir prazos previstos para defesa com exigências que não serão atendidas.
Nas palavras do “especialista”: “Se ele (governo) fizer uma exigência para tudo ao mesmo tempo agora, ninguém consegue atender. Então uma maneira de forçar a caducidade é fazer exigências que não se consegue atender.”
No ar, portanto, a instituição de um undue process of law no âmbito da ANM.
Há menos de dois anos, a ANM – destinatária da sugestão do “especialista” – estabeleceu por meio de Resolução n° 122/2022, os procedimentos aplicáveis à apuração de infrações à legislação do setor mineral. O processo administrativo sancionador previsto na citada resolução mantém, como não poderia deixar de ser, o princípio do devido processo legal.
O “especialista” sugere, portanto, de uma só penada, o desrespeito ao princípio do contraditório e da ampla defesa assegurado aos litigantes no processo administrativo ou judicial pela Constituição Federal (art. 5°, LV) e um cenário de arbítrio institucional.
Inacreditável como “ideias” desse tipo surgem do nada, até vicejam e encontram guarida. Felizmente, como diria o Ibrahim Sued, os cães ladram e a mineração passa!